terça-feira, 13 de maio de 2008

Giorgio Agamben - A Comunidade que Vem - Capítulo 1

O ser que vem é o ser que, seja como for, importa. Na enumeração escolástica do transcendental (quodlibet ens est unum, verum, bonnum seu perfectum, qualquer que seja o ente é um, verdadeiro, bom ou perfeito), o termo que restando impensado em cada um, mas que condiciona o significado de todos os outros termos é o adjetivo quodlibet. A tradução corrente no sentido de “não importa qual, indiferentemente” é certamente correta, mas, quanto à forma, exprime exatamente o contrário do latino: quodlibet ens não é “o ser, não importa qual”, mas “o ser tal que, seja como for, importa”; ele contém, então, desde sempre uma devolução ao desejar, o ser não-importa-qual (qual-si-voglia)[1] está em relação original com o desejo.

O qualquer que seja que aqui está em questão não toma, de fato, a singularidade na sua diferença em relação a uma propriedade comum (a um conceito, por exemplo: o ser russo, francês ou muçulmano), mas somente no seu ser tal como é. Com isto, a singularidade se desliga do falso dilema que compromete a experiência do universal, uma vez que o inteligível, conforme a bela expressão de Gersonide, não é um universal nem um indivíduo enquanto contido numa classe, mas “singularidade enquanto singularidade qualquer que seja”. Nesta, o-ser-tal é retomado do seu pertencer a esta ou aquela propriedade, da qual identifica a atribuição a este ou aquele conjunto, a esta ou aquela classe (os russos, os franceses, os muçulmanos) – e retoma não em relação à outra classe ou em relação a uma simples ausência genérica de toda atribuição semelhante. Pois o-ser-tal, que resta constantemente escondido na condição de atribuição (“um x tal que pertence a y”), e que não é de modo algum um predicado real, vem igualmente à luz: a singularidade exposta como tal é não-importa-qual (qual-si-voglia), isto é, amável.

Uma vez que o amor jamais se dirige em relação a esta ou aquela propriedade do amado (o-ser-loiro, jovem, meigo, coxo), da mesma forma que nem mesmo desta prescinde em nome da insípida generalidade (o amor universal): ele requer o objeto com todos os seus predicados, o seu ser tal como é. Ele deseja o qual só enquanto é tal – isto é o seu particular fetichismo. Pois a singularidade qualquer que seja (o Amável) não é mais capacidade de qualquer coisa, desta ou daquela qualidade ou essência, mas somente a capacidade de uma incapacidade. O movimento, que Platão descreve como anamnese erótica, é aquele que transporta o objeto não na direção de outra coisa ou outro lugar, mas na direção de seu ter-lugar – na direção da Idéia

AGAMBEN, Giorgio. La comunità che viene, Torino: Bollati Boringhieri, pp. 9-10, 2001 – Tradutor: Marcus Vinícius Xavier de Oliveira.



[1] A afirmação da existência de uma relação original entre o ser qualquer que seja e o desejo, donde a idéia de uma devolução daquele a este, somente é compreensível tendo-se em vista que a palavra italiana qualsivoglia já trás em sua composição o desejo (voglia).

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Henri Cartier Bresson




"[...] the decisive moment, it is the simultaneous recognition, in a fraction of a second, of the significance of an event as well as the precise organization of forms which gives that event its proper expression."


segunda-feira, 5 de maio de 2008

A Palavra Final - Elemér Horváth

A Palavra final pertence ao Editor
ele tem um secretário da cultura
o Secretário tem um primeiro-ministro
o Primeiro-ministro tem um governo
o Governo tem uma polícia
a Polícia tem armas

Eu tenho um poema
o poema é um tirano
recusa assumir compromissos
no sentido estrito da palavra
é a palavra final.

HORVÁTH, Elemér. A neve é azul como uma laranja.